6.8.08

Mais uma história de Internet

Dei de cara com uns sites que tão discutindo um projeto de lei do Senador Eduardo Azeredo, do PSDB-MG. Azeredo quer "combater" o famoso cibercrime, enrijecendo os mecanismos de fiscalização de práticas dos internautas, através de propostas que prevêem, por exemplo, a divulgação de dados de acesso dos usuários por parte dos provedores, que seriam alguma coisa como detetives coadjuvantes.

Conheci a história através de uma petição encabeçada por acadêmicos, contra o projeto, que já conta com mais de 100 mil assinaturas e se encontra neste link. Imediatamente achei a proposta um absurdo e marquei meu nome no abaixo-assinado. Eis um trecho do texto de protesto:


Um projeto de Lei do Senado brasileiro quer bloquear as práticas criativas e atacar a Internet, enrijecendo todas as convenções do direito autoral. O Substitutivo do Senador Eduardo Azeredo quer bloquear o uso de redes P2P, quer liquidar com o avanço das redes de conexão abertas (Wi-Fi) e quer exigir que todos os provedores de acesso à Internet se tornem delatores de seus usuários, colocando cada um como provável criminoso. É o reino da suspeita, do medo e da quebra da neutralidade da rede. Caso o projeto Substitutivo do Senador Azeredo seja aprovado, milhares de internautas serão transformados, de um dia para outro, em criminosos. Dezenas de atividades criativas serão consideradas criminosas pelo artigo 285-B do projeto em questão. Esse projeto é uma séria ameaça à diversidade da rede, às possibilidades recombinantes, além de instaurar o medo e a vigilância.

Em seguida fui procurar o projeto, mais a título de curiosidade mesmo, e caí na página do senador. Ele se explica à sociedade, em artigo publicado na Folha de S. Paulo. De acordo com o senador, o projeto pretende garantir punição a praticantes de delitos como "difusão de vírus, guarda de material com pornografia infantil, roubo de senhas, estelionato eletrônico, clonagens de cartões e celulares, e racismo quando praticado pela internet". O trecho a seguir desmente completamente o que diz a petição:


O Projeto de Lei não trata de pirataria de som e vídeo nem da quebra de direitos de autor, que no Brasil são matérias já tratadas por leis específicas. E não serão atingidos pela proposta aqueles que usam as tecnologias para baixar músicas ou outros tipos de dado ou informação que não estejam sob restrição de acesso. A lei punirá, sim, quem tem acesso a dados protegidos, usando de subterfúgios como o phishing, por exemplo, que permite o roubo de senhas bancárias.

Saí desse texto meio atordoado, me sentindo partidário de um radicalismo e não consegui achar o projeto completo em canto nenhum. Ironicamente, o que refrescou minha consciência foi uma reportagem bem completa no G1. O que deu pra perceber é que, por um lado, o texto da petição é extremamente radical e sequer procura explicar o projeto numa dimensão mais ampla, fazendo um blabla óbvio sobre internet, liberdade de expressão e um socorro, preciso deixar meu P2P ligado. De outro lado, as declarações do senador são extremamente cínicas e simplistas, já que ele faz questão de ignorar a ambigüidade do artigo 285-B, que criminaliza a ação de "obter ou transferir, sem autorização ou em desconformidade com autorização do legítimo titular da rede de computadores, dispositivo de comunicação ou sistema informatizado, protegidos por expressa restrição de acesso, dado ou informação neles disponível", que quer dizer, mais ou menos, nada ou tudo, dependendo do ponto de vista. Pode significar, por exemplo, que acessar um site já pode ser considerado crime, uma vez que os dados são armazenados na memória RAM. Ou pode significar que se caracterize crime apenas a prática de burlar um sistema e infiltrar-se num banco de dados.

O argumento de Azeredo diz respeito à velha história da jurisprudência. Tudo bem, os juízes vão ter bom senso pra discernir. Ou não? O contra-argumento é que pode haver abuso de poder de certas autoridades, e o poder oficial, a gente sabe, está sempre coligado à corporação do bolso. Por isso, volto a ficar tranqüilo e certo da minha assinatura na petição, não pela defesa do radicalismo, e sim a favor da clareza na hora de escrever uma lei, de forma que ela não nos trate como idiotas.

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